Pesquisa está disponível em banco de dados gratuito e on-line. Trabalho inédito desenvolvido em núcleo de estudos da UnB valoriza história e memória da arte teatral da região

 

O inventário foi divulgado em três versões: impressa, digital e banco de dados. Todo o material está disponível para consulta pública. Arte: Necoim/UnB 

 

Onde estão os documentos sobre o teatro do Distrito Federal? Como contar essa história? Essas foram as perguntas que motivaram a elaboração da pesquisa realizada no Núcleo de Estudos da Cultura, Imagem, Oralidade e Memória (Necoim/Ceam) da UnB pelas professoras Ana Lúcia Gomes e Elizângela Carrijo, do curso de Museologia da Faculdade de Ciência da Informação (FCI).

 

O inventário contempla resumos de matérias publicadas pelo Jornal de Brasília (JBr) sobre o teatro regional, entre 1972 e 1999. A coleta foi realizada desde a primeira edição do JBr até o fim da década de 1990. O marco foi definido com base na revolução digital que teve início nos anos 2000, quando as empresas de comunicação passaram a disponibilizar aos leitores e usuários buscas em banco de dados digital. “Resolvemos dinamizar, otimizar o tempo de quem busca informação sobre o teatro da cidade”, resume Elizângela, sobre a ideia.

 

Como o principal objetivo é democratizar o acesso sobre a arte teatral do DF, a pesquisa gerou três produtos: o livro, o arquivo digital e a base de dados. A publicação foi produzida em dois volumes, contendo mais de mil páginas ao todo. Foram impressos 78 exemplares, distribuídos para acervos públicos que preferencialmente trabalham com arte. Os arquivos digitais (I e II) estão disponíveis para download e a base de dados é de acesso gratuito a todos os interessados. 

 

A escolha pela fonte de informações deve-se ao tipo de registro possibilitado pela mídia em questão. As publicações de um jornal oferecem ordem cronológica para os fatos. “Por mais que seja um fragmento, apenas um ângulo da realidade, o periódico deixa vestígios ao longo do tempo, pela forma como é produzido”, explica a pesquisadora Elizângela. Como uma das características mais marcantes da atividade cênica é, justamente, a efemeridade, a documentação que resultou do trabalho propicia a construção de uma espécie de cartografia do teatro do DF.

 

Embora não tenha virado publicação, iniciativa semelhante já havia sido feita pela equipe de documentação de outro grande jornal da cidade. O fato motivou as docentes a escolherem o segundo mais antigo jornal contínuo do DF ainda em atuação: o Jornal de Brasília. Para surpresa das pesquisadoras, foram encontrados 27.641 registros ligados ao tema. Na avaliação de Elizângela, o número é bastante expressivo, tendo em vista que elas possuíam como parâmetro o catálogo do outro grande periódico da capital, que registrou 8 mil matérias em um período de quatro décadas. Segundo ela, a grande diferença pode ser explicada pela forte editoria de cultura do JBr quando foi criado. 

Estudantes durante o trabalho de pesquisa no acervo do Jornal de Brasília. Foto: Necoim/UnB 

 

TRABALHO MINUCIOSO  Ao longo de quatro anos, com cerca de 30 pessoas envolvidas, a rotina diária da pesquisa era composta por idas ao acervo do jornal. Lá, eram folheadas página por página, em busca de um registro. Depois de encontradas, as informações eram anotadas. A marcação nos jornais tinha que ser feita a mão e a lápis, para não danificar o documento original. Para manusear as edições do JBr, era preciso portar equipamentos de proteção individual, como luvas, máscaras, óculos e jaleco. Após esse trabalho, era necessário registrar as informações em uma planilha digital, contendo, entre outros detalhes, resumo do texto, data da matéria, autoria e caderno. Um pesquisador era responsável por conferir todas as informações. Caso fosse detectada alguma incoerência, voltava-se ao acervo para averiguação.

 

“Os alunos escolhidos para trabalhar na pesquisa tinham que ter um perfil muito específico, atendendo muitas habilidades e competências”, comenta Elizângela. A docente lembra que os jornais, naquela época, seguiam uma diagramação bem diferente das versões atuais e, em geral, não eram organizados por editorias. Por isso, todas as páginas do periódico eram verificadas, incluindo os classificados. A pesquisa teve início em 2012 e foi financiada, em 2017, pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAP/DF).

 

NOVOS OLHARES  Uma das finalidades do inventário é subsidiar professores de Artes Cênicas, História ou que desenvolvam trabalhos sobre o Distrito Federal com material para planejamento didático. “Com isso, será possível suscitar inquietações nos estudantes e fazer outras leituras da cidade”, vislumbra Elizângela. 

 

Em uma análise preliminar do banco de dados, é possível constatar que foram identificados 149 grupos de teatro que circulavam na região na década de 1970. Foram mapeados 105 locais de apresentação de artistas, não apenas no Plano Piloto, mas nas 31 regiões administrativas. Além dos espaços tradicionais, como o Teatro Nacional Cláudio Santoro e o Teatro Dulcina, foi bastante significativo o número de apresentações em escolas públicas. “É interessante essa relação da arte cênica com o público em formação, porque indica a importância da arte como elemento formador”, avalia a pesquisadora.

Pesquisa foi coordenada pelas professoras Elizângela Carrijo e Ana Lúcia Gomes. Foto: Vinícius Santa Rosa

 

Para ela, um objetivo cumprido pelo trabalho, de colaborar com os legados dos artistas mais velhos e valorizar a cultura local, também é o papel de uma universidade pública. "O inventário é um ponto de partida, com quase 28 mil motivos para que se possa desfrutar dos registros da pesquisa. É uma grande surpresa o que esse trabalho pode suscitar, mas a gente acredita que estimular novas pesquisas sobre o teatro reforça memórias", diz a docente, destacando que, embora o acervo seja privado, a história é pública. 

 

Além disso, a expectativa é dar subsídios para o desenvolvimento de políticas públicas culturais. “Quem tem a intenção de fazer uma política séria sobre o teatro no DF, precisa não apenas conhecer as demandas dos artistas, mas estudar esses movimentos; precisa entender a história”, argumenta. Um destaque do inventário é a Federação do Teatro Amador do Distrito Federal (Fetadif). “Ela conseguia aglutinar os artistas, fazer com que suas reivindicações fossem potencializadas numa época em que ainda não existia a Secretaria de Cultura, por exemplo”. Além disso, a Federação realizou vários eventos na cidade, como fórum e congresso, dando voz às demandas dos profissionais da arte.

 

 

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