Estudo desenvolvido na UnB descreve causas da vulnerabilidade entre pessoas com mais células adiposas e indica caminhos para tratamento mais preciso

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Pesquisadores do Laboratório de Imunologia e Inflamação (Limi) da UnB publicaram, na última terça-feira (28), estudo que pode ajudar a diminuir sequelas de pessoas obesas que contraíram covid-19. O trabalho aponta caminhos que são de aplicação imediata pelas redes de saúde, uma vez que indica soluções para as complicações mais comuns de indivíduos com Índice de Massa Corporal (IMC) acima de 34 (considerados de risco), infectados pela Sars-CoV2.  

 

Os principais agravantes da doença em pacientes obesos são a hipercoagulação e a inflamação, que resultam em série de complicações. "As principais que temos observados nesses pacientes, internados e com diagnóstico positivo no Distrito Federal (DF), são tromboemolismo pulmonar, AVC isquêmico, infarto e doenças relacionadas às lesões microvasculares e formações de trombos [obstruções]", explica o cirurgião geral atuante na terapia intensiva e integrante do Limi, Luilson Coelho.

 

Com a pesquisa, os cientistas acreditam ser possível contribuir para a diminuição da mortalidade de indivíduos obesos pela covid-19, que totalizam 13% do número total de óbitos no DF, segundo dados divulgados pela Secretaria de Estado de Saúde do DF em 28 de julho. 

 

Gabriel Pasquarelli do Nascimento, doutorando do Limi e primeiro autor do artigo, que foi publicado na revista Frontiers in Endocrinology, acredita que, com os dados, já é possível adotar um protocolo que indique caminhos mais adequados para o tratamento de pessoas obesas infectadas pela covid-19. Ele também defende que é necessário conscientizar a população da necessidade do emagrecimento. "O conhecimento trazido pelo artigo se torna crucial para conscientizar pessoas com obesidade a buscarem mudança de estilo de vida a fim de se prevenirem", alerta.

 

FUNCIONAMENTO – Para um vírus infectar uma célula, ele utiliza um mecanismo similar ao da chave e fechadura. O receptor, nessa analogia, é a fechadura da célula. Caso a célula não tenha o receptor ao qual o vírus se conecta, ela não será infectada. "Quanto mais obeso, maior o reservatório para replicação viral, mais tecido para se replicar esse vírus tem", explica a coordenadora do Limi, Kelly Magalhães. 

 

As células adiposas do corpo humano, assim como as dos pulmões, possuem esse receptor. Dessa forma, os cientistas detalham, no artigo, como as células de gordura são acometidas pelo Sars-CoV2 e como o vírus utiliza o excesso de células para se replicar. Indivíduos obesos, com Índice de Massa Corporal acima de 34, tendem a ter essas células espalhadas por todo o corpo, formando "depósitos de vírus", que se alastram rapidamente pelo organismo do paciente. O conhecimento já existia, mas as conexões feitas pelos cientistas nunca haviam sido publicadas em um único artigo.

 

Células adiposas espalhadas pelo corpo são grandes "reservatórios de vírus". Imagem: reprodução

 

O acúmulo excessivo de gordura leva à inflamação do tecido adiposo por ativar células da resposta imune. Além disso, o tecido gorduroso de indivíduos com obesidade apresenta disfunções metabólicas que são consideradas um outro risco. Para retardar o processo inflamatório, é necessário perder peso.

 

Os protocolos sugeridos pelos pesquisadores são destinados principalmente aos internados em terapia intensiva ou aos que fazem uso de ventilação. "Não são para pessoas com covid-19 que estão em casa e que apresentam sintomas brandos", ressalta Kelly, afirmando que o tratamento proposto, a base de anticoagulantes e anti-inflamatórios, só deve ser feito com supervisão.

 

INOVAÇÃO – A pesquisa, desenvolvida em parceria com a Universidade de Laval, no Canadá, indica ainda os alvos farmacológicos para o tratamento da doença. Os cientistas apontam que os dois principais agravantes da doença em pacientes obesos são a hipercoagulação e a inflamação. "Anticoagulantes e anti-inflamatórios tendem a ser mais eficazes no tratamento dos pacientes obesos", explica a coordenadora do Limi, professora Kelly Magalhães.

 

O Limi desenvolve ainda um trabalho que busca desvendar os fatores de hipercoagulação mais presentes em indivíduos obesos. Feito em parceria com hospitais do Distrito Federal, os pesquisadores avaliam pacientes internados em terapia intensiva e verificam quais os principais marcadores de hipercoagulação e inflamação em pacientes obesos e magros. Dessa forma, a indicação para as indústrias farmacológicas pode ser ainda mais precisa, indicando os exatos alvos que uma medicação precisa atingir. 

 

Cientistas descrevem como a inflamação e hipercoagulação afetam as células. Conhecimento pode ajudar indústria farmacológica a produzir medicamentos mais eficazes. Imagem: reprodução

 

COMUNIDADE – Os autores do estudo pensam que é necessária a reflexão, por parte dos formuladores de políticas públicas de saúde, sobre os alarmantes índices de obesidade no país. "Nesse momento em que as redes sociais dominam a vida de muita gente, creio que utilizá-las para conscientização e debate sobre o tema é bastante relevante", aponta Gabriel.

 

A preocupação de que a população se conscientize é justificada também pelos dados de obesidade e mortes em decorrência da infecção por Sars-CoV2 não só no Brasil, mas em todo o mundo. O Reino Unido, país mais afetado pela pandemia na Europa, com quase 46 mil mortes, tinha, em 2019, 28,7% de sua população obesa, segundo as estatísticas apresentadas pela Câmara dos Comuns. Já os Estados Unidos, que lidera o ranking de mortes pela doença em nível global, com mais de 150 mil vítimas, tinha, entre 2017 e 2018, mais de 42% de obesos na população, de acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (Center for Disease Control and Prevention, em inglês).

 

Com essa preocupação em mente, o laboratório mantém um perfil no Instagram para divulgar informações confiáveis sobre ciência, saúde e educação. O público pode conferir vídeos, com temáticas diversas. São conteúdos, por exemplo, sobre o mecanismo de funcionamento do álcool e sabão no combate ao coronavírus, apresentação de fatos que contestam a ideia de que o vírus foi produzido em laboratório na China, além da divulgação de outros trabalhos, como o efeito neuroprotetor do Ômega 3 contra o zika vírus.

 

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