Um artigo publicado em fevereiro, no periódico Communications Earth & Environment, do grupo Nature, alerta sobre os riscos que mais de 5 mil ribeirinhos da Amazônia enfrentam por viver em áreas vulneráveis à erosão e ao assoreamento. A pesquisa avaliou 51 comunidades da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, que ocupa uma área de cerca de 11 mil quilômetros quadrados, a 600 km de Manaus.
O estudo é parte de um projeto de colaboração internacional e foi desenvolvido pelos pesquisadores Alice Fassoni (IG/UnB), em colaboração com André Zumak, Heloísa Pereira, Paula Silva e Ayan Fleischmannem, do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá. Também assinam o texto Fabrice Papa da Université de Toulouse (França) e Ana Nascimento, da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA).
O objetivo dos pesquisadores era fazer o mapeamento, em escala regional, do risco dos efeitos da erosão, fenômeno conhecido como Terras Caídas, e da sedimentação fluvial. “A ideia surgiu a partir da observação do processo de Terras Caídas no rio Solimões. Daí, conseguimos elaborar uma metodologia para avaliar o processo e os riscos”, explica Alice.

A partir de dados globais de imagens de satélites, captadas entre 1986 e 2021, foi possível identificar quais comunidades sofrem erosão, sedimentação ou estabilidade, e qual a intensidade dos processos. Os dados foram ainda combinados com índices de vulnerabilidade, a partir de dados socioeconômicos como Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), número de mulheres, crianças, idosos e distâncias até áreas urbanas próximas a Tefé.
PESQUISA – Então, o risco foi calculado pela multiplicação dessas variáveis, dividido em cinco categorias: muito baixo, baixo, moderado, alto e muito alto. As informações revelaram que 44,5% das populações ribeirinhas enfrentam problemas relacionados à erosão e sedimentação, que são intensificados pelas alterações climáticas e por secas severas, como a que ocorreu entre 2023 e 2024.
O trabalho ressalta que, mesmo com a seriedade dos impactos, os problemas de erosão e sedimentação nos rios da Amazônia permanecem amplamente ignorados e não são adequadamente considerados nos mapeamentos de desastres em nível regional. A pesquisa identificou quatro comunidades com risco extremamente alto e sete com risco elevado. "Com o processo de erosão intenso, pode ocorrer o desaparecimento ou migração para um lugar mais distante comunidades, interferindo no modo de vida e na perda de identidade com o território", afirma André Zumak.
Os pesquisadores explicam que a abordagem criada pelos cientistas pode ser implementada em outras áreas da Bacia Amazônica, como nos rios Juruá e Purus. O objetivo é que os dados ajudem instituições, como o Serviço Geológico Brasileiro (SGB) e a Defesa Civil, na detecção e monitoramento de regiões vulneráveis, contribuindo para políticas públicas mais eficientes voltadas à prevenção e resposta a desastres ambientais.

"O planejamento, principalmente na questão de construção de escolas e posto de saúde, longe de local que tem tendência a erosão, previne a perda de investimento. Além de precaver no caso da estiagem, para pessoas doentes, idosos ou crianças não ficarem sem assistência, devido ao isolamento durante as secas extremas", salienta André.
CONTINUIDADE — O grupo de pesquisa dedica-se a estudar as mudanças ambientais na Amazônia, usando ferramentas como sensoriamento remoto, modelagem hidrodinâmica e dados coletados em campo. As pesquisas abrangem desde a análise das alterações na topografia das áreas alagadas e no fluxo das águas até os efeitos dessas mudanças na biodiversidade e nas comunidades locais.
Além disso, também investiga eventos climáticos extremos, como secas e cheias, que têm se tornado mais frequentes nos últimos anos. Em abril, os pesquisadores divulgaram um artigo sobre os fatores que influenciam a deposição de sedimentos nas planícies de inundação da Amazônia e seus impactos. O artigo mais recente foi publicado em junho e mostra uma redução significativa nos níveis de água em toda a bacia amazônica durante a seca severa de 2023, usando dados de um satélite novo chamado SWOT.