Tese de doutorado revela modelo que traz mais precisão em posicionamento geográfico. Tecnologia pode ser aplicada a redes veiculares e redes sem fio

 

 

Ilustração que integra a tese de doutorado sistematiza a interação entre o sinal telefônico e o arranjo de antenas em carros inteligentes.
Ilustração que integra tese de doutorado mostra interação entre o sinal telefônico e o arranjo de antenas em carros inteligentes. Imagem: Arquivo pessoal

 

Antenas estão por todos lugares. Desde as grandes torres até as de tamanhos bem menores do que a haste sobressalente de rádios e de televisões antigas. Celulares, tablets e smartwatches são exemplos de dispositivos cuja comunicação wi-fi só é possível graças às antenas acopladas em seu interior. Um avanço no uso desta tecnologia tornou-se possível com os resultados da tese de doutorado de Marco Marinho, egresso de Engenharia de Redes de Comunicação da Universidade de Brasília.

 

O estudo propõe o uso de sistemas de antenas múltiplas para obter localização geográfica de alta precisão. A tecnologia pode ser aplicada para melhorar sistemas de veículos inteligentes e sistemas de posicionamento – como o GPS (Global Positioning System). “Nossa grande contribuição é o aumento da precisão da informação obtida. Para distâncias de até 50 metros, conseguimos precisão no posicionamento de até um metro. É algo de que não se tem registro na literatura até então", garante Marinho.

 

Se aplicada em sistemas de carros inteligentes, o recurso permite detectar outro veículo ou pedestre em aproximação, antes mesmo que o motorista possa vê-los, prevenindo acidentes fatais. Segundo o pesquisador, as tecnologias atuais de carros autônomos são suficientes para detectar outros veículos, mas precisam ser aprimoradas no caso de pedestres.

 

"Imagine o carro em um cruzamento onde não há visibilidade para enxergar um ciclista se aproximando. Basta que o ciclista esteja com um celular ligado para que o sistema de antenas do veículo detecte o sinal do celular. Então o sistema do carro emite um aviso para que o motorista ou o próprio carro freie a tempo”, exemplifica o engenheiro.

 

Outro uso da tecnologia é para posicionamento preciso em ambientes fechados, como grandes centros comerciais. “O GPS do celular não funciona em ambientes fechados. Se o usuário procura pelo portão de embarque em um grande aeroporto, em um país que ele não fale a língua, esta tecnologia pode direcioná-lo para o caminho exato”, ilustra Marinho.

 

Há diversas outras aplicações para o recurso, como seu aproveitamento em áudios-guias de museus ou na localização de mercadorias armazenadas em grandes depósitos. “Sabendo precisamente onde o usuário está, é fácil entregar a informação. Caminhando em um shopping, o cliente poderia receber informações sobre um produto específico localizado à sua frente”, acrescenta o pesquisador.

Mudança no modelo matemático trouxe ganhos de precisão. Imagem: arquivo pessoal do pesquisador.
Mudança no modelo matemático trouxe ganhos de precisão. Imagem: Arquivo pessoal

 

INOVAÇÃO – Os arranjos de antenas múltiplas, chamados MIMO (multiple-input multiple-output), são parte essencial dos sistemas de comunicação sem fio. O principal uso nos dias atuais é na obtenção de taxas de dados mais rápidas. Já na pesquisa de Marco Marinho, o uso é proposto para melhorar a comunicação entre veículos e o posicionamento em ambientes fechados. A precisão geográfica obtida como resultado da investigação foi possível com a adoção de novos parâmetros matemáticos para calcular posicionamento.

 

“Fizemos o primeiro teste prático após dois anos de estudo. Apesar de promissores, os resultados eram insatisfatórios porque o modelo matemático não nos permitia chegar à precisão desejada”, conta o engenheiro. Ele explica que a matemática atualmente adotada nos sistemas de localização é simplificada para facilitar cálculos e deixar os sistemas menos complexos.

 

O impasse levou o engenheiro a reavaliar a física do problema. “Os atuais sistemas de posicionamento consideram a propagação da onda de modo planar, semelhante a um quadrado se deslocando no espaço. Nós consideramos a onda como uma esfera se expandido no espaço. Isso resultou em ganhos no modelo matemático”, esclarece Marinho.

 

Ele revela que a mudança nos parâmetros matemáticos inicialmente não estava planejada. “Não era algo óbvio para nós. Foi como tirar os olhos do microscópio e olhar para outras ferramentas de trabalho que tínhamos na mesa.” Segundo Marinho, o novo modelo, apesar de mais complexo, resulta na precisão desejada. 

Arranjo de antenas da Universidade de Halmstad no local onde foram realizados os testes do estudo. Imagem: arquivo pessoal do pesquisador
Arranjo de antenas da Universidade de Halmstad, na Suécia, onde foram realizados os testes do estudo. Foto: Arquivo pessoal

 

MÃOS À OBRA – Os testes práticos foram realizados na Universidade de Halmstad, na Suécia, onde o pesquisador cursou metade do doutorado. "Utilizamos um sistema enorme, com 128 antenas. Fizemos o teste do alto de um dos prédios da universidade, medindo o sinal de celular de um aluno de mestrado que se deslocava pelo pátio da instituição”, detalha Marinho.

 

As informações sobre o deslocamento do estudante foram captadas pelo arranjo de antenas, que estava conectado a um sistema computacional. “A precisão variou de acordo com a distância do aluno, mas funcionou bem quando ele estava em um raio de até 50 metros, o que é suficiente para o sistema do veículo tomar um decisão caso seja preciso frear", avalia.

 

Segundo Marinho, o mesmo tipo de informação sobre posicionamento pode ser obtida pela tecnologia de radar, mas com limitações que foram superadas em seu estudo. "O radar faz a identificação emitindo um sinal que precisa bater no alvo e voltar. Suponha que o alvo seja um pedestre e haja uma barreira física no meio do trajeto, como uma parede, então já não seria possível detectar o pedestre. Com o sinal do celular isso não acontece, por ser um tipo de onda que consegue atravessar barreiras físicas”, explica.

 

USO DA TECNOLOGIA – A pesquisa de Marco Marinho foi orientada em cotutela pela Universidade de Brasília e pela Universidade de Halmstad, na Suécia. Todos os cálculos e metodologia utilizados constam na tese, cuja versão em inglês já está disponível. A versão em português será disponibilizada em breve pela Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD) da UnB.

 

Com a publicação, não há direito de patente sobre a tecnologia. "A minha grande conquista é concluir o trabalho. Mas já temos recebido contato de empresas da Suécia interessadas em cooperação para auxiliarmos na implementação da tecnologia”, conta Marinho.

 

O pesquisador explica que a tecnologia pode ser aplicada em veículos inteligentes a partir da instalação de antenas nos retrovisores. “Isso não mudaria a estética do carro pois seria instalado dentro da carcaça do retrovisor. Também não teria impacto significativo no preço do veículo, mas um ganho relevante em segurança e confiabilidade”, comenta o estudioso. 

"Os resultados da pesquisa superaram minhas expectativas", compartilha o engenheiro Marco Marinho. Foto: Raquel Aviani/Secom UnB

 

TRAJETÓRIA – O interesse de Marinho pela temática surgiu na graduação, quando o tópico foi apresentado pelo docente João Paulo Lustosa, coordenador do Laboratório de Processamento de Sinais em Arranjos de Sensores (Lasp), do Departamento de Engenharia Elétrica (ENE) da UnB. O engenheiro cursou o mestrado e metade do doutorado no Centro Aeroespacial Alemão (DLR). A formação foi concluída na Universidade de Halmstad, na Suécia. Todo processo foi orientado em cotutela pela Universidade de Brasília. 

 

Para chegar às inovações alcançadas no doutorado, Marinho trilhou um caminho de dedicação. “Comecei o doutorado com uma importante bagagem do mestrado. Como queria ampliar a pesquisa, precisei dedicar muito tempo relendo livros de Física e fazendo cálculos. Os testes práticos aconteceram apenas nos últimos meses.”

 

De acordo com o docente João Paulo Lustosa, a ida de Marinho para o DLR marcou o início de uma parceria com a instituição alemã. "Desde então, essa tem sido uma cooperação extremamente benéfica para a UnB, principalmente porque o centro possui uma gigantesca estrutura de construção de protótipos”, afirma Lustosa. A cooperação que resultou na vinda de dois professores do DLR para o Brasil. Ele também destaca que a parceria com a Universidade de Halmstad “oportuniza o trabalho com pesquisadores de alto nível, internacionaliza a pesquisa e abre parcerias com a indústria automobilística sueca”.

 

Com o título de doutor em mãos, Marinho regressou ao Brasil e pretende ingressar na docência, onde vê oportunidade para dar continuidade à pesquisa. Para ele, o diferencial da formação no exterior foi o acesso a tecnologias ainda não disponíveis nas universidades brasileiras. "Mas formação da UnB não deve em nada às renomadas instituições do exterior. O egresso daqui sai tão bem quanto ou mais preparado que outros estudantes”, avalia Marinho. 

 

 

 

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