Estudo da UnB mostra que cinco microbacias que abastecem a cidade são impróprias para uso e diminuíram de tamanho por causa da ocupação urbana e rural.

Pesquisa do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília identificou problemas em cinco de 11 microbacias do Distrito Federal, que funcionam como captações de água da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb). Dessas, cinco estão em situação preocupante de sustentabilidade. A qualidade e o nível da água diminuíram nos últimos 22 anos.


Para chegar ao resultado, o pesquisador Fábio Bakker, que trabalha na Caesb, desenvolveu e aplicou um indicador que resume as condições das microbacias, que correspondem a 5% do abastecimento do Distrito Federal. O Índice de Sustentabilidade de Bacias Hidrográficas (ISBH) monitorou as microbacias em três períodos: 1984, 1995 e 2006.


O córrego Currais, em Taguatinga, teve a pior avaliação pelo ISBH. Em 1984, o índice que já era ruim, ultrapassando pouco mais de 0,30, caiu pela metade. Para serem avaliadas como estando em boas condições, as microbacias devem ter o ISBH acima de 0,60.


A situação precária do córrego foi identificada pela própria Caesb. Em 2005, a companhia parou de retirar água do córrego alegando que, por causa da baixa qualidade, a região deixou de ser viável para o abastecimento. "Os indicadores de dimensões ambientais e de qualidade da água caíram quase 100% no período do estudo", explica o pesquisador. O córrego Cachoeirinha, na região do Paranoá, também despencou no ISBH. Em 1984, estava em boas condições, com índice de 0,62. Em 1995, o valor foi para 0,50 e, em 2006, 0,28. Os córregos Mestre D`Armas, Barrocão e Quinze também são os outros três que compõem a lista de áreas com situação preocupante, com índices em 2006 de 0,36, 0,40 e 0,45 respectivamente.


OCUPAÇÃO DO SOLO -
A expansão urbana desordenada e a atividade agrícola são os principais fatores de queda da qualidade e área ocupada pelas microbacias. "Com a expansão urbana, a população se aproximou dos mananciais, pressionando o meio ambiente", explica Fábio Bakker.


Embora as microbacias pesquisadas representem apenas 5% do abastecimento do DF, elas são estratégicas para garantir o fornecimento de água no Distrito Federal. “Elas não representam um volume muito grande, mas são uma fonte barata”, explica o autor, Fábio Bakker. Na opinião dele, o resultado do universo estudado vale para todo o DF. “Essas captações refletem as condições das demais”, afirma. Ao total, a Caesb dispõe de 26 captações de água. As maiores são as do Lago Descoberto, em Águas Lindas, e em Santa Maria, na região do Parque Nacional de Brasília.


Ilustração: Marcelo Jatobá/UnB Agência


INDICADORES -
A professora Mônica Veríssimo, do Centro de Estudos Avançados e Multidisciplinares (Ceam/UnB), afirma que o índice desenvolvido por Fábio Bakker poderá ser utilizado nas bacias hidrográficas de todo o país, mas alerta para a dificuldade de pesquisas como essa chegarem ao poder público. “Onde estão as políticas para evitar a ocupação desordenada nessas bacias”, pergunta. Segundo ela, estudos como esses se sucedem sem que resultem em transformações concretas.


No Brasil, ainda não existem indicadores ou índices padronizados que indiquem as condições das bacias hidrográficas. Estudos da Agência Nacional de Águas (ANA) e da Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente apresentaram propostas, mas nenhuma foi aplicada ainda.


Flávia Rodrigues, especialista em recursos hídricos da ANA, explica que a atual política de recursos hídricos é recente e por isso ainda não foi possível adotar um índice nacional. “Precisávamos de um número com base em dados de fácil coleta, para que seja viável a aplicação em todo o território”, afirma.


O pesquisador lembra que o planejamento em longo prazo deve ser uma prioridade para o governo, já que Brasília está numa região do Cerrado, onde as projeções sobre os efeitos das mudanças climáticas apontam para o agravamento das estações secas. “O índice pode orientar políticas públicas de controle do uso e ocupação do solo de modo a evitar uma crise hídrica no Distrito Federal.”


BOAS CONDIÇÕES -
As outras seis microbacias que estão em condições satisfatórias são: Ribeirão Pedras, Taquari, córrego Capão da Onça, córrego Fumal, Brejinho e Corguinho. Taquari, que fica no Paranoá, apresentou índices satisfatórios desde 1984, acima de 0,60. Cerca de 80% da microbacia é cercada, o que impede que ações externas afetem o ambiente e a qualidade da água. No caso da Ribeirão Pedras, localizada em Taguatinga, o ISBH em 2006 de 0,77 mostrou que a gestão adotada na bacia foi positiva. Essa microbacia tem 95% de sua área inserida na Floresta Nacional de Brasília.


Fábio afirma que nunca um índice vai refletir a realidade por completo, mas o recurso cumpre papéis que o torna indispensável. “Um índice baixo pode funcionar de alerta para sinalizar que alguma coisa está errada. Então, é preciso descobrir o que está acontecendo, nesse caso, pode ter sido uma diminuição da qualidade da água”, exemplifica o professor Paulo Sérgio, membro do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paranoá. Os índices servem também para fazer uma avaliação do sucesso de determinada ação. “Os índices são tanto um ponto de partida como um ponto de chegada”, afirma.