A expectativa era grande para aquele domingo, 7 de outubro de 2018. Milhões de brasileiros foram às urnas para exercer o direito do voto. O dia também reservou outras sensações para cerca de 50 alunos da Faculdade de Comunicação (FAC) da UnB. Esse grupo tinha a responsabilidade de cobrir o primeiro turno das eleições para o informativo Campus Online e redes sociais.
Sugerida por um aluno, a ideia cresceu e acabou envolvendo professores e estudantes de três disciplinas da FAC: Oficina de Texto, do primeiro semestre; Apuração e Texto Jornalístico I, do segundo, e Campus Multimídia, do quinto. Os estudantes calouros participaram do início do processo, fornecendo material que serviu de base para a produção jornalística, preparando o perfil dos candidatos e o resumo das propostas de cada partido.
A atividade jornalística é organizada em pelo menos cinco etapas de produção: pauta, apuração, redação, edição e publicação. “Pode-se dizer que os alunos da disciplina Oficina de Texto ficaram com a pré-pauta. Os de Apuração e Texto Jornalístico cuidaram da cobertura factual e da produção das notícias. No Campus Multimídia, cuidaram da edição e publicação do material”, explica o professor Solano Nascimento, idealizador da parceria entre as turmas.
No dia da votação, os 23 alunos da disciplina produziram 27 matérias, que abasteceram a página do Campus Online. Os outros 27 estudantes do quinto período – Campus Multimídia – ficaram encarregados de fazer a edição e publicação dos textos no site ou produzir conteúdo próprio para as redes sociais do informativo.
O trabalho era complementar e a experiência possibilitou integrar disciplinas com caráter prático. “Cada grupo tinha uma função diferente e dependia um do outro. Essa relação entre alunos e professores serviu a um propósito comum”, avalia Solano.
Ele detalha que a cobertura abrangeu diversas regiões administrativas do Distrito Federal. “Optamos por definir os locais mais próximos de onde os estudantes já moram. Em seguida, fizemos a distribuição dos horários em que cada um iria atuar, atendendo todo o período de votação”, explica.
“Priorizamos pautas diferenciadas das que já são contempladas na mídia convencional. Por exemplo, não escalamos ninguém para cobrir os tribunais eleitorais, como o TSE ou TRE, uma vez que isso já é exaustivamente abordado por veículos de imprensa regionais ou nacionais."
Os temas abordados foram diversos, indo dos mais clássicos, como as filas e o tempo de espera, a temáticas mais recentes, como problemas com biometria e o título digital. “Cobrimos as eleições, mas principalmente os eleitores”, resume o docente.
TENDÊNCIA MULTIMÍDIA – A disciplina Campus Multimídia é estritamente prática e gerencia um portal próprio de notícias – o Campus Online –, que possui público variado, mas especialmente formado pela comunidade acadêmica da UnB. O professor responsável, Zanei Barcellos, esclarece que a disciplina possibilita aos graduandos em Jornalismo experienciar um produto digital multiplataforma.
“Buscamos fazer um conteúdo diferenciado para todas as plataformas, com narrativas específicas, de acordo com público e características de cada meio”, informa. Os profissionais em formação são divididos entre repórteres e editores, composição similar a de empresas de comunicação. Atualmente, cinco canais digitais compõem a disciplina: site, Facebook, Instagram, Twitter e Whatsapp. “Todas ferramentas gratuitas e de livre acesso, de modo a facilitar a gestão pelos próprios estudantes”, complementa.
Quanto à cobertura do primeiro turno das eleições, o professor Zanei Barcellos acredita que foi um processo bem moderno e atual, seguindo a tendência de mercado do jornalismo on-line. “A experiência foi muito válida e deu oportunidade aos alunos para tomar suas próprias decisões”, aponta o docente, que acompanhou o trabalho de perto, mas sem muitas interferências.
Editora de site, a estudante Flavia Said foi uma das responsáveis pela edição das notícias. “Foi um dia puxado, mas muito enriquecedor. Recebíamos conteúdo o tempo todo e, como já tinha passado por prévia edição do professor, fizemos poucas adaptações”, conta.
O Campus Online seguirá a cobertura neste domingo (28), dia de segundo turno. Dessa vez, apenas estudantes do quinto semestre participam. “Devemos fazer uma divulgação mais aprofundada, explorando outros recursos multimídia, indo além do texto e imagem”, indica Flavia.
JORNALISMO NA PRÁTICA – A maioria dos alunos participava pela primeira vez de uma atividade jornalística. Entre os desafios para conseguir produzir uma notícia, muitos se depararam com a desconfiança de eleitores. Ana Carolina Teixeira cobriu uma zona eleitoral em Ceilândia e disse que teve dificuldades para conseguir fontes. “Foi muito difícil, a maioria das pessoas não nos levava a sério”, comenta.
A companheira de cobertura Ana Lídia Araújo apresentou-se como repórter do jornal laboratório ao entrevistar um senhor que fazia boca de urna em Taguatinga. “Então você não é repórter de verdade!”, foi o que ouviu. Mesmo assim, ela conta que respondeu sem titubear: “Hoje eu sou!”.
Apesar do receio de abordar as pessoas, Millena Campello conta que a experiência foi muito positiva. “Eu estava aberta às pautas. Logo que amanheceu, percebi que o tempo estava instável e já escrevi uma matéria sobre a previsão do dia.”
O entusiasmo pode ser medido em números, na quantidade de textos entregues pela aluna. Mesmo com orientação de redigir apenas uma matéria, a estudante que cobriu o período da manhã em Taguatinga enviou quatro notícias para o site.
“A experiência foi exatamente como eu esperava. Tem aquela sensação boa e um misto de várias emoções." Para ela, há aprendizados que faculdade nenhuma pode ensinar, como saber lidar com os imprevistos.
A tarefa de abordar crime eleitoral foi bastante desafiadora para Giulia Leal, que estava em Vicente Pires. Ela fez uma matéria sobre a detenção de um candidato que praticava boca de urna. “As pessoas estavam com medo de contar o que viram. Como eu não tinha credencial, havia o receio de acharem que eu estava fazendo algo ilegal”, relata.
Para o professor Zanei, essa dinâmica é muito rica para o aprendizado em jornalismo. “Eles passam a descobrir dilemas e ter que lidar com diferentes questões, de ordem ética ou moral.” O professor Solano destaca que a atividade serve de portfólio para os estudantes. “O jornalismo da internet tem sido um começo de carreira para muitos jovens. Grande parte das vagas para iniciantes estão em mídias on-line”, observa.
EXPERIÊNCIA PARA VIDA – Em uma zona eleitoral de Planaltina, a primeira pessoa da fila não estava só: a mulher segurava no colo uma criança com hidrocefalia. Marcella Rodrigues imaginava que não fosse conseguir a entrevista, pois poderia ser interpretada como uma exposição da situação da avó e do menino.
“Eu fiquei surpresa, porque ela foi muito gentil e me contou toda sua história de vida. A mulher é avó da criança e afirmou que era seu dever votar.” Refletindo sobre a experiência, a estudante ressalta que naquele momento pôde perceber como o jornalismo pode transformar o jornalista. “É claro que lidamos com a impessoalidade, mas não podemos perder o lado humano”, analisa.
“Tem a parte jornalística de vivenciar a prática, mas por ser uma eleição e pelo local que eles atuaram, há um ganho para a vida deles”, considera Solano Nascimento. "Estamos vivendo um período de muita intolerância. Esses estudantes tiveram a possibilidade de experimentar isso em áreas muitas vezes periféricas do DF e conhecer de perto os dramas sociais”, frisa o professor.
>> Acompanhe o segundo turno das eleições no Campus Online