Estudo descreve acelerado processo de desmatamento e diminuição do volume hídrico e adverte: município goiano precisa de socorro urgente dos governantes,

O crescimento acelerado e desordenado pode inviabilizar a vida em uma cidade localizada a menos de 50 quilômetros da capital do país e provocar reflexos no Distrito Federal. Miserável e abandonado, o município de Águas Lindas de Goiás caminha para o esgotamento ambiental e, sem ações imediatas dos governos, estará insustentável em 20 anos.


É o que aponta estudo defendido pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade de Brasília. “A água ficará imprópria para consumo, os mananciais contaminados e a violência poderá ganhar dimensão assustadora,”, afirma a pesquisadora Camila Guedes Ariza, autora da dissertação Qualidade Ambiental em Águas Lindas de Goiás e a Gestão dos Recursos Hídricos.


O estudo mostra que o uso indisciplinado do solo causou desmatamento, assoreamento e diminuição do volume hídrico subterrâneo nos últimos 15 anos, quando a população do município triplicou. Vivem hoje na cidade 159,5 mil pessoas.


A qualidade ambiental da cidade foi avaliada a partir de dados coletados na Secretaria de Meio Ambiente e Agricultura do município, do consórcio Águas Lindas e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os números foram analisados com o indicador P.E.I.R (pressão, estado, impacto e resposta), adotado pelas Nações Unidas para avaliar o meio ambiente em cidades do mundo. “A metodologia mede os impactos ambientais e analisa os problemas sem desprezar a ideia de que o ambiente existe como um sistema de múltiplas interações”, explica Camila.


A pesquisadora alerta que as consequências da degradação ambiental vão além de Águas Lindas. A contaminação da água pode atingir o Lago do Descoberto, que representa cerca de 60% do abastecimento do DF. Cerca de 3 mil famílias moram no Setor Coimbra, próximo ao Descoberto, em loteamentos irregulares. “Quando chove, as águas escorrem para o Descoberto. Sem coleta de lixo e saneamento adequados a água é contaminada”, aponta Oscar Netto, professor da Engenharia Civil e Ambiental da UnB e ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA).


ESGOTO –
 A qualidade da água do município é agravada pela falta de saneamento. O sistema de esgoto está sendo estruturado pelo consórcio entre a Companhia de Saneamento Ambiental do DF (Caesb) e a Saneamento de Goiás (Saneago), mas deve levar dois anos para ficar pronto e atenderá apenas 40% da população, que hoje soma 159.505 mil habitantes, três vezes mais que em 1995. “Vamos atender 92 mil pessoas nesta primeira etapa”, conta Mércio Viana, engenheiro da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) e secretário do Conselho do Consórcio Águas Lindas. A primeira etapa da obra vai custar R$ 85 milhões. O restante da população não tem prazo para ser beneficiado com o sistema de esgoto da cidade. O consórcio estima que em 2025 a cidade terá 270 mil habitantes.


O único tratamento que a água da cidade recebe é a cloração, que extermina bactérias. São 110 poços que recebem o tratamento e abastecem 95% da população. O tratamento convencional conta com decantação, filtração e cuidados químicos. A água que a Caesb disponibiliza para o Plano Piloto passa pelo processo convencional. “A cloração é o mínimo que a água deve receber. Água sem tratamento não é apenas problema ambiental, mas de saúde pública”, avisa Oscar Netto, professor da Engenharia Civil e Ambiental da UnB e ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA).


Rodrigo Peixoto, técnico em saneamento da Caesb, defende que o tratamento está correto. “Portaria do Ministério da Saúde deixa claro que águas de poços subterrâneos não precisam de decantação nem filtração”, afirma o técnico. Já o secretário de Agricultura, Jorge Montanha, confessa que não bebe água dos poços. “Eu compro água mineral”, conta ele, que foi também secretário de Meio Ambiente. Montanha lembra que foram investidos cerca de R$ 13 milhões para a construção de reservatórios e estação simplificada de tratamento da água, mas a obra deve levar dois anos para ser entregue.


ABANDONO –
 Todos os problemas identificados passam pela desordem da administração pública da cidade e a falta de ação dos governos, segundo o estudo. “É uma cidade órfã, ninguém toma conta. Uma cidade abandonada pelos governos federal e estadual. A gente faz o que pode”, confirma Jorge Montanha. O descaso se reflete na descrença da população. “É sempre a mesma coisa. Em anos de eleição eles vêm aqui e prometem colocar asfalto e arrumar o esgoto, mas nada acontece”, conta Maria Júlia Silveira, 52 anos, moradora do bairro Coimbra.


A falta de asfalto nas ruas traz desconforto principalmente para as crianças, que transformam a lama em brincadeiras de faz de conta, alheias aos riscos que o esgoto escorrendo na porta de casa traz. Moradora de Águas Lindas há seis anos, a dona de casa Alzirene da Silva, reclama que o filho chega empoeirado na escola todos os dias, mesmo após tomar banho. “É como se nós, os pais, não tomássemos conta dos nossos filhos”, afirma. “Um desrespeito tão grande quanto conviver com insegurança, uso de drogas na esquina, falta de ônibus, ruas esburacadas e esgoto correndo na porta de casa”, diz.  “A única coisa boa aqui é a vizinhança”, completa que Gardênia Santana, moradora da região a 14 anos.

 

AÇÕES SUGERIDAS PARA RECUPERAR A CIDADE

- Criar mecanismos de cultura e lazer, como parque, praças e quadras de esporte

- Capacitar jovens e adultos

- Criar associações ou cooperativas

- Criar empregos através de atração de empresas para a cidade

- Construir aterro sanitário e gestão de recursos sólidos

- Arborizar a cidade