Pesquisa traz luz sobre o debate da luta de classes e explica a ligação entre desigualdades históricas e a estrutura atual do capitalismo, atualizando conceitos sobre exploração e opressão. Cinco teses da UnB receberam menção honrosa

Anastácia Vaz/Secom UnB

 

Pesquisador nordestino e professor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Paulo Wescley Pinheiro venceu o Prêmio CAPES de Tese 2023, na área de Serviço Social, com trabalho desenvolvido na UnB. A pesquisa defendida no Programa de Pós-Graduação em Política Social (PPGPS/SER/UnB), em 2022, aprofunda conceitos e propõe nova perspectiva sobre as relações de exploração e opressão contra mulheres, pessoas negras e pessoas LGBTQIA+.

 

Intitulada Entre os rios que tudo arrastam e as margens que os oprimem: as determinações ontológicas da unidade exploração-opressão, a tese tem uma sustentação teórica fundamentada e compromisso com a defesa dos direitos humanos. O estudo faz parte do Programa de Doutorado Interinstitucional (DINTER), em acordo firmado entre os PPGs em Política Social da UnB e da UFMT.

 

Além da gestão geográfica oriunda da experiência interinstitucional, a tese foi desenvolvida no conturbado período da pandemia. Mesmo assim, a professora aposentada do PPGPS, Ivanete Boschetti, se diz feliz e emocionada com o resultado da última tese que orientou na UnB, onde construiu toda a carreira acadêmica.

 

“A orientação totalmente remota não foi fácil. Para o doutorando, especialmente o acesso à bibliografia ficou muito restrito com as bibliotecas fechadas. Apesar disso, ele conseguiu fazer uma tese excelente e com uma extensa referência bibliográfica e teórica”, afirma a orientadora.

 

Ao explicar a importância da tese para o meio acadêmico, Ivanete diz que a pesquisa trata de um tema muito contemporâneo e que vem mobilizando muitas lutas sociais contra todas as formas de discriminação e opressão. “Ela está conectada com o tempo presente e com as questões que demandam não só respostas teóricas, mas também demandam levar para a sociedade informações”, salienta.

 

“É uma tese teoricamente fundamentada, socialmente engajada e que atende a todos os requisitos de uma universidade pública socialmente referenciada e que articula ensino, pesquisa e extensão”, resume Ivanete.

 

DEDICAÇÃO – Formado pela Universidade Estadual do Ceará (Uece), a trajetória de Paulo também faz parte das complexas desigualdades sociais do país. Oriundo do sertão do Ceará, ele teve que ir para a capital do estado para ter acesso ao ensino superior.

 

Antes disso, sempre trabalhou com arte e educação, inclusive em organizações ligadas à diversidade sexual, gênero e juventude, o que contribuiu com as escolhas acadêmicas de suas pesquisas.

A tese de Paulo faz parte de uma parceria na qual professores da UnB ministravam as aulas na UFMT, em módulos concentrados. Durante um semestre, o então doutorando também assistiu aulas na UnB. Com a pandemia, a orientação passou a ser totalmente remota. Foto: Arquivo pessoal

 

“Na minha graduação, eu trabalhei a temática de adolescentes em conflito com a lei, mídia e consumo. Já no mestrado, minha dissertação falava do avanço do neoconservadorismo religioso na formação profissional. Foi quando eu adensei as primeiras experiências de trabalho que culminaram na minha tese”, explica o doutor.

 

Questionador, Paulo conta que a tese faz parte de um processo de amadurecimento, ligado à construção profissional como assistente social, professor e pesquisador, mas também como militante e pai atuante de uma menininha, companheira que dormia no colo enquanto ele escrevia a tese.

 

“Eu me questionava sobre as mediações dessa questão social. É fácil entender o desemprego a partir da definição da relação capital-trabalho e de uma série de questões mais imediatas, como fome e várias outras coisas”, pontua. “Mas como você entende o racismo, a violência contra a mulher, a LGBTfobia? Eu me questionei sobre a pertinência de um debate da luta de classes para explicar essas outras questões”, afirma o professor.

 

Explicando seu trabalho, Paulo afirma que a ontologia é pensar a essência do ser. E que, diferente de outras correntes teóricas, que dizem que o ser humano não tem nenhuma essência ou que tem uma essência natural ou sobrenatural, a Ontologia do Ser Social vai demonstrar que só existe uma essência no ser humano, que é a própria história e, por isso, é capaz de desnaturalizar as desigualdades sociais. É nessa direção que o trabalho faz a ligação entre desigualdades históricas e a estrutura atual do capitalismo.

 

“O meu trabalho – ao contrário de outras pesquisas que explicam que existe uma relação entre exploração e opressão ou que existe apenas uma interseccionalidade entre elas – demonstra que esse processo é de unidade”, defende. “É possível você até enfatizar questões, mas é impossível achar que é somente uma relação entre desigualdades. Elas se fundam unitariamente e se realizam com dimensões de unidade, e elas só podem ser superadas em unidade”, expõe. 

 

Além de premiada, a tese rendeu outros frutos. “Desde a defesa, há um ano, eu não parei. Agora, a gente está reverberando o resultado da tese em publicações de capítulos de livro, rodando o país em eventos acadêmicos, dando palestra, conversando com outras pesquisadoras e pesquisadores, polemizando os resultados”, comemora o professor.

Teses premiadas da UnB e seus respectivos autores, programas de pós-graduação e orientadores. Arte: Virgínia Soares/Secom UnB

 

PRÊMIO CAPES – O prêmio Capes reconhece os melhores trabalhos de doutorado no Brasil com base na originalidade, relevância e impacto no desenvolvimento científico e social. Criado em 2005, abrange todas as áreas de conhecimento da pós-graduação stricto sensu.

 

Com 1.469 trabalhos concorrendo, 49 foram premiados, com benefícios para os vencedores e seus orientadores. A cerimônia de premiação está marcada para dezembro. Além da tese vencedora, outros cinco trabalhos da UnB receberam menção honrosa.

 

Entre eles, a tese Fadiga por Fretting em Carregamento de Amplitude Variável, desenvolvida pelo engenheiro André Luis Pinto, que ganhou prêmio Jaap Schijve Award, concedido pelo Comitê Internacional de Fadiga Aeronáutica e Integridade Estrutural (ICAF, da sigla em inglês), este ano.

 

A tese se distingue pela originalidade ao realizar testes e desenvolver metodologia capaz de prever a falha de componentes mecânicos de aeronaves pelo o que é chamado de fadiga de fretting.

 

Também receberam menção honrosa, o trabalho Letalidade branca: negacionismo, violência anti-indígena e as políticas de genocídio, do doutor Felipe Cruz, na área de Antropologia; e a tese Parcerias para o desenvolvimento produtivo uma estratégia para o desenvolvimento do complexo econômicoindustrial da saúde (CEIS) no país, da doutora Kellen Rezende, na área de Saúde Coletiva.

 

Os últimos dois são da área de Psicologia. O primeiro com o tema Design culturo-comportamental e educação equitativa: Estratégias para promoção de engajamento escolar, da egressa Flora Lorenzo; e o trabalho O lado de dentro da rua: o corpo-morada nas narrativas de mulheres negras em situação de rua, de Ana Luísa Moreira.

 

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