Professor Márcio Poças aposta em técnica que prevê alterações genéticas em fungos usados para transformar bagaço de cana de açúcar em energia. Pesquisa foi apresentada em simpósio de pesquisadores da Biologia Molecular.

Pesquisa da Universidade de Brasília promete diminuir os custos para produção de enzimas usadas na fabricação de etanol a partir do bagaço da cana de açúcar. O professor Márcio Poças, do Instituto de Ciências Biológicas, parte dos princípios da epigenética para desenvolver a tecnologia. O estudo foi apresentado nesta quinta-feira, 1º de setembro, em simpósio organizado pelo programa de pós-graduação em Biologia Molecular.


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A epigenética estuda a capacidade de genes idênticos produzirem efeitos diferentes por causa de alterações químicas. “A minha hipótese de trabalho é que essas alterações podem aumentar a produção de enzimas por fungos, e que essa capacidade poderia ser passada para as gerações seguintes”, aposta Márcio.


Márcio conduz testes nos fungos Humicola grisea, Penicillium echinulatum e Aspergilus oryzae, capazes de produzir enzimas hidrolíticas. “Esse tipo de enzima é usada para quebrar as moléculas de celulose do bagaço de cana”, explica o professor. “O resultado da quebra é a glicose, que depois de fermentada por leveduras, outro tipo de fungo, produz o etanol”.


O professor acredita que o uso de drogas para provocar alterações epigenéticas nos fungos pode superar os métodos usados atualmente na indústria. “A técnica vai ser útil nos casos em que os organismos já sofreram o máximo de mutações genéticas possíveis para aumentar sua produtividade”, explica.


O professor explicou ao UnBCiência como os fenômenos relacionados à epigenética aparecem na natureza. “Podemos ver isso nos cruzamentos entre o cavalo e o burro fêmea ou entre a égua e o burro macho”, conta. No primeiro caso nasce um jegue e no segundo uma mula. “Essa diferença só acontece por causa da epigenética”, explica. “Mesmo que o genoma dos pais desses animais fossem idênticos nos dois casos o padrão de expressão deles é diferente no macho e na fêmea”.


Segundo ele, as alterações químicas que produzem esse efeito podem ser de dois tipos: um, chamado metilação, onde o radical químico metil (CH3) se une a uma molécula de DNA, e outro que modifica proteínas associadas ao DNA.


RESÍDUOS –
As tecnologias para a produção de etanol a partir do bagaço de cana de açúcar – chamado etanol de segunda geração – estão sendo pesquisadas em várias instituições do país e já são aplicadas na indústria. Elas permitem que restos da produção de etanol, no caso o bagaço da cana, sejam também utilizados para produzir o combustível. Até então esses resíduos eram jogados fora ou queimados em termoelétricas, causando poluição. “Com a técnica, esse material pode ser reutilizado tanto para produzir energia como para fabricar ração animal, já que a glicose produzida pela quebra da celulose é mais facilmente digerida pelo gado”, explica Márcio.


Aldo Dillon, professor da Universidade de Caxias do Sul que dividiu a mesa com Márcio Poças, desenvolve pesquisas sobre o fungo Penicillium echinulatum, também presente nos estudos da UnB. Ele defende que o uso desse fungo substitua o do Trichoderma reesei na indústria do etanol. “Esse fungo possui a maior capacidade de secreção de enzimas hidrolíticas”, afirma. “Acredito que esse fungo terá uma posição importante no mercado. Já produzimos várias patentes no Brasil e estamos pleiteando uma nos Estados Unidos”, comemora.


Junto com os dois estava a pesquisadora Cristina Machado, da Embrapa Agroenergia. Ela apresentou as pesquisas que estão sendo desenvolvidas na instituição também na área de produção de enzimas hidrolíticas. “Estamos estudando o rumem de caprinos. O órgão do animal possui várias bactérias capazes de produzir essas enzimas”, conta. Os estudos da empresa pretendem descobrir bactérias com maior produtividade dessas enzimas.


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A Embrapa também está desenvolvendo a tecnologia de imobilização de enzimas. A técnica atua em outra etapa da indústria do etanol, que permite que as enzimas utilizadas na quebra da celulose possam ser reaproveitadas depois da reação. Para isso, as enzimas são fixadas em um suporte especial. Quando a reação termina, o suporte é retirado junto com as enzimas e pode ser usado em outras reações. “A imobilização tem potencial de baratear bastante os processos enzimáticos”, defende.


O Simpósio de Biologia Molecular e Biotecnologia começou nesta quinta-feira e reúne pesquisadores e estudantes para discutir os principais avanços dessas áreas. Além dos trabalhos apresentados por Márcio Poças, Aldo Dillon e Cristina Machado, foram apresentados 142 pôsteres com resultados de pesquisas de mestrandos, doutorandos e pós-doutorandos do curso. O encontro homenageia o professor e pesquisador Cezar Martins de Sá, que faleceu no dia 25 de janeiro deste ano.


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