Há 15 anos, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) em Nanobiotecnologia, coordenado pelo professor do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília Ricardo Bentes, analisa a aplicação da Terapia Fotodinâmica (TFD) para tratamento de diversos tipos de câncer. Os estudos já passaram por várias fases e testes. Agora, a técnica é usada na pesquisa de doutorado em nanociência e nanobiotecnologia desenvolvida na Universidade pelo oncologista clínico Antônio Vendette. O médico testa o uso da TFD para o tratamento de neoplasia intraepitelial cervical (NIC) 1 e 2, lesão que pode levar ao câncer do colo uterino.
Desde dezembro, em clínica na cidade de Rio Branco (AC), Vendette faz testes em mulheres para avaliar a eficácia da terapia. Nesse período, 14 voluntárias com NIC 1 e 2 foram tratadas com TFD e os resultados foram satisfatórios."Não há efeito colateral na aplicação ou qualquer efeito complicador, como infecção ou hemorragia. Uma semana após uma sessão de terapia, os exames preventivos deram negativo para células cancerígenas e não se observa reincidência dessas células", lista o doutorando.
A partir da oitava voluntária, o oncologista passou a observar, também, a presença de HPV (vírus associado ao câncer do colo do útero) e analisar se a TFD seria capaz de erradicá-lo. “Existe esperança de que a terapia possa ser aplicada nessa segunda situação”, comenta.
TERAPIA – A TFD consiste na associação de um fármaco fotossensibilizador (cujas moléculas são ativadas pela incidência de luz) e de feixes luminosos direcionados. Ao serem ativadas, as substâncias liberam espécie reativa de oxigênio, comumente chamada de radical livre, que age nas células próximas. Para tratar o câncer, o elemento fotossensibilizador é aplicado na região de interesse. Depois, é aplicada a luz diretamente no ponto em que se almeja matar a célula tumoral.
A espécie reativa do oxigênio pode matar as células tumorais de três formas. Na primeira, o oxigênio singlete (que age exterminando as células tumorais) mata o vaso sanguíneo da célula cancerosa, o que a leva à necrose. Outra possibilidade é que atinja a célula e a leve à extinção. Na terceira, a incidência da espécie reativa do oxigênio prejudica a célula em longo prazo, em um processo chamado apoptose, que resulta em morte.
Na pesquisa realizada por Vendette, o fármaco utilizado em nanoestruturas é o alumínio-cloro-ftalocianina. "É a primeira vez que se usa essa substância em nanoestruturas e é a primeira vez que temos estes resultados", afirma Ricardo Bentes. Até o momento, cem por cento dos casos estão em remissão, fase em que não há sinal de atividade da doença. O professor explica que a escolha da substância se deu pelo grau de pureza em que é obtida; por não reagir no escuro; por gerar o oxigênio singlete e por responder ao espectro de luz vermelha, interessante por ser aquele que alcança regiões mais profundas da pele.
VANTAGENS - Um dos pontos positivos da técnica é fato de não ser imunossupressora, como as demais terapias de combate ao câncer. Avalia-se, também, se ocorre ativação do sistema imunitário, que ajudaria no tratamento da doença. "Até hoje, não há descrito qualquer mecanismo de resistência. E não há efeitos colaterais graves, como perda da fertilidade", observa Vendette. Ademais, o médico destaca que a terapia é um tratamento ambulatorial, de baixo custo e sem risco para a paciente. Por essa razão, o oncologista acredita que, confirmados os testes, há chances de a técnica se tornar uma realidade em consultórios em pouco tempo.
A TFD tem sido investigada para tratamento de outros tipos de câncer, como o de pele, o de boca e o de esôfago. Uma desvantagem da terapia, contudo, é a limitação de alcance da luz. Para ser usada, é necessário que haja uma cavidade para introduzir o feixe de luz.
NOVOS TESTES - Os testes iniciais se darão com, no mínimo, 35 voluntárias. Com o intuito de avaliar a eficácia do tratamento também contra o vírus do HPV, a triagem das pacientes terá como critério a existência da neoplasia intraepitelial cervical (NIC) 1 e 2 e o vírus do HPV. As voluntárias devem ser encaminhadas por ginecologista, possuir biópsia realizada até seis meses antes e colposcopia. Elas recebem o tratamento sem custo, além de acompanhamento por dois anos. Caso haja reincidência das células tumorais, as mulheres receberão o tratamento tradicional adequado para o caso.
A cada ano, cerca de 530 mil novos casos de câncer do colo do útero são notificados no mundo. Trata-se do quarto tipo de câncer mais comum entre as mulheres, responsável por 265 mil óbitos anualmente. Estimativas do Instituto Nacional de Câncer (INCA) indicam, que neste ano, 16.340 novos casos de câncer de colo de útero devam ser diagnosticados no Brasil.