As estratégias usadas pelas empresas para garantir qualidade de vida aos funcionários são completamente diferentes daquelas sonhadas pelas equipes de trabalho. Pesquisa de grupo coordenado pelo professor Mário César Ferreira, psicólogo e pesquisador, mostra que funcionários e empresas e órgãos públicos tem entendimentos completamente diferentes sobre o que é qualidade de vida.
O estudo revela que enquanto muitos trabalhadores entendem qualidade de vida como reconhecimento do trabalho prestado, prazer durante a realização das tarefas, relacionamentos saudáveis com os colegas e possibilidade de crescimento profissional, as empresas investem em treinamentos e técnicas de gerenciamento de stress, como florais, acompanhamento nutricional e dança. “O que se faz é pegar o funcionário em condições inadequadas de trabalho e colocar em uma aula de ioga, por exemplo. Depois de cinquenta minutos de prática, ele volta para o mesmo ambiente deteriorado”, explica. "São medidas que focam no indivíduo e não no ambiente de trabalho", analisa.
A pesquisa foi realizada a partir da análise de 40 sites brasileiros de empresas que atuam na área de qualidade de vida no trabalho. O Grupo de Estudos e Pesquisas em Ergonomia aplicada ao setor público (ErgoPublic), coordenado por Mário César, identificou um total de 85 atividades diferentes direcionadas para o bem-estar no ambiente de trabalho. Entre elas havia gerenciamento de stress, mapa astral, alinhamento energético com pedras quentes, florais, acompanhamento nutricional, dança e programas de treinamento. “Todas as atividades tinham como foco aumentar a resistência física ou mental do indivíduo”, destaca o professor.
Por outro lado, a pesquisa também entrevistou um total de 2.105 servidores públicos federais para saber o que eles realmente entendem por qualidade de vida no trabalho. “As resposta foram bem diferentes das difundidas práticas anti-stress”, afirma Mário César. Dentre as demandas apontadas pelos entrevistados estavam a necessidade de reconhecimento, de sentir prazer no trabalho, relacionamentos saudáveis com os colegas e possibilidade de crescimento profissional.
“Os meios usados pelas empresas para melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores são como um ofurô corporativo”, diz Mário César, referindo-se à tina de banho de origem oriental usada para relaxamento. “O funcionário sente um alívio com aquela prática depois volta para a mesma situação de stress”. Segundo o professor, a tendência é que a adesão a esses programas complementares seja alta no começo, mas decline rapidamente depois de algum tempo. “O trabalhador não é bobo, ele passa a desconfiar das propostas oferecidas pela organização”.
O resultado do estudo foi apresentado pelo professor durante o ciclo de palestras Gestão com Pessoas, na última quarta-feira. No encontro, organizado pelo Decanato de Gestão de Pessoas (DGP), foram apresentadas diferentes pesquisas que denunciam as deficiências das políticas de qualidade de vida das organizações.
DIAGNÓSTICO - Para fazer a diferença na qualidade de vida dos trabalhadores, as organizações devem se comprometer a identificar precisamente o que os trabalhadores querem. “A única maneira de fazer isso é perguntando a eles”, afirma Rodrigo Ferreira, mestre em administração pela UnB. Rodrigo apresentou metodologia desenvolvida pelo ErgoPublic para diagnosticar a situação de uma empresa ou órgão no que diz respeito à qualidade de vida no trabalho.
Pelo método, os funcionários atribuem notas a cinco áreas principais relacionadas ao contexto de trabalho: condições de trabalho, organização do trabalho, relações socioprofissionais de trabalho, reconhecimento e crescimento profissional e elo trabalho-vida social. “A partir dessa avaliação é possível conhecer o desempenho da organização por meio de uma nota”, explica. Mais do que isso, em cada área os trabalhadores avaliam quesitos específicos onde é possível identificar em que área a empresa deve atuar. Condições de trabalho, por exemplo, desdobra-se em “O posto de trabalho é adequado a realização de tarefas?”, “A temperatura é adequada?” e outros.
Em um outro nível o pesquisador analisa o cotidiano dos funcionários mais de perto. Aqui as informação colhidas partem de observações no local de trabalho e depoimentos dos trabalhadores. “Com o cenário completo, a organização pode montar uma política efetiva de qualidade de vida”, acredita.
As palestras do ciclo Gestão com Pessoas estão acontecendo toda quarta-feira no auditório do Beijódromo com visões de especialistas em gestão de trabalho.