Pesquisador aponta que o problema viria do procedimento inadequado de pasteurização por falta de equipamentos adequados.

Em 2010, 13 mil bebês recém-nascidos foram alimentados com ajuda dos bancos de leite do Distrito Federal. Mas a técnica usada para armazenamento faz que com alguns nutrientes se percam. Pesquisa da Universidade de Brasília mostra que falta gordura em algumas mamadeiras, um componente necessário para o crescimento. Segundo o pesquisador Luiz Antônio Borgo, da Faculdade de Ciências da Saúde, isso ocorre por problemas na pasteurização, processo que esquenta e esfria o líquido rapidamente para matar bactérias.


A pesquisa seguiu os passos que o leite segue da coleta até a distribuição. As amostras foram colhidas de uma doadora do Hospital Universitário de Brasília. Luiz usou uma do leite cru, uma recém-pasteurizada e oito amostras congeladas. Analisou-as por oito meses, de 30 em 30 dias e quantificou os ácidos graxos (elementos constituintes da gordura), caracterizando 11 deles. A análise mostrou uma grande variação de gordura tanto para mais como para menos, o que mostra que existem problemas na coleta, na pasteurização e no congelamento. "Cada amostra tinha quantidades diferentes de gordura, mas isso não estava relacionado ao tempo que ficaram congeladas e sim a problemas anteriores a esse procedimento", afirma Luiz.


De acordo com o pesquisador, o problema maior não é a pasteurização em si, mas a falta de agitação no processo. “Essa falta de agitação quando o leite está esquentando provoca a ruptura dos glóbulos de gordura, e a ascensão deles”, afirma. Segundo Luiz, se houvesse agitação o leite seria homogeneizado, ou seja, a gordura se espalharia pelo leite e não haveria essa separação dos glóbulos – isso faz com que a gordura se separe do soro do leite, como um tipo de nata. No processo usado nos bancos de leite da cidade, a agitação acontece manualmente, a cada 5 minutos, o que, segundo Luiz, é insuficiente. "Essa pasteurização lenta, sem agitação apropriada, com uma longa exposição ao calor aumenta a quebra dos glóbulos de gordura", diz.


Quando este leite com a gordura separada é distribuído nas mamadeiras, não há como saber qual a quantidade de gordura de cada um. Os glóbulos quebrados acabam presos facilmente nas paredes dos vidros de congelamento e da mamadeira. A gordura é essencial para o crescimento do bebê, já que é o nutriente que dá mais energia para o humano. Em cada grama de gordura existem 9 calorias. Nos carboidratos são 4 por grama. Além do problema na pasteurização, o congelamento é prejudicial por ser lento. Os cristais de água formados no resfriamento lento perfuram os glóbulos de gordura, que se separam.


De acordo com Luiz, uma das soluções seria melhorar os equipamentos da rede pública. “A pasteurização e congelamento não têm um controle de temperatura eficiente, não existe agitação adequada e são demorados”, diz. Ele conta que, em países desenvolvidos, o processo é diferente. Lá o aquecimento acontece a 73º graus por 15 segundos com posterior congelamento, nos mesmos moldes da indústria de alimentos. Aqui o leite fica em banho-maria na temperatura de 63ºC por 30 minutos. O pesquisador dá recomendações para diminuir esta perda de gordura: reduzir o tempo entre a coleta e a pasteurização, na pasteurização lenta usar sistema de agitação e também utilizar recipientes menores para a coleta, para evitar congelamento prolongado.


REFERÊNCIA - O Brasil é referência em aleitamento materno. Em 2010, foi assinada uma carta, em Brasília, que pretende levar o conceito da rede brasileira de banco de leite por todo o mundo. Ela foi criada em 1999, e ganhou um prêmio da Organização Mundial de Saúde, como melhor estratégia para tentativa de redução de mortalidade infantil nas Américas. Em Brasília existem 14 bancos de leite, sendo 10 deles públicos. Mais de 23 países importaram o modelo.


A Secretaria de Saúde do DF já tem licitações para comprar equipamentos que fazem a agitação automática. Um deles, um equipamento nacional, está sendo testado no Centro de Referência Nacional da Fiocruz, no Rio de Janeiro, que pretende implantar a tecnologia em toda a rede brasileira.


Miriam Santos, coordenadora de aleitamento materno e banco de leite humano da Secretaria de Saúde do DF, defende a qualidade do material distribuído. “Todas nossas práticas estão documentadas em teses e dissertações que comprovam não haver problemas na qualidade desse leite”, diz.