Liderado por equipe da UnB, estudo classificou o risco de principais plantas medicinais utilizadas por pacientes com sintomas da doença

Laura Ockel/Unsplash

"Árvore chinesa é aposta de vacina contra covid-19"; "Conheça a quina: planta que inspirou a hidroxicloroquina"; "Entenda como a Cannabis medicinal pode auxiliar no combate ao coronavírus". Basta uma busca rápida na internet e é possível encontrar milhares de matérias como essas abordando a eficácia de plantas medicinais no combate ao vírus que nos últimos meses tem pautado diariamente a mídia.

 

A pandemia do novo coronavírus é o assunto da vez e tem gerado muitas notícias envolvendo remédios milagrosos e curas para a covid-19, que já vitimou mais de um milhão de pessoas em todo o mundo. O uso indiscriminado de fitoterápicos contra a doença motivou investigação do grupo de pesquisa do Laboratório de Produtos Naturais (LaProNat), vinculado à Faculdade de Ciências da Saúde (FS) da Universidade de Brasília. Com apoio de outros pesquisadores do Brasil e exterior, a equipe publicou estudo sobre o assunto no periódico de impacto internacional Frontiers in Pharmacology.

 

O artigo traz informações científicas sobre plantas medicinais comumente usadas por pacientes no tratamento de três dos sintomas iniciais da covid-19 – tosse e sinais de gripe ou de resfriado. Também foram selecionadas aquelas geralmente citadas em documentos de órgãos oficiais, como da Organização Mundial de Saúde (OMS) e de agências reguladoras, caso da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Com isso, foram analisadas 39 espécies de plantas com propriedades medicinais.

 

"Ainda não há cura para a covid-19, e o conhecimento de sua fisiologia está em construção, por isso é muito importante a divulgação de riscos, possíveis efeitos adversos e interações medicamentosas que podem ocorrer com a utilização desses remédios. Como uma prática inerente à cultura do brasileiro, é inevitável o uso de plantas de forma empírica e não orientada", contextualiza a professora da FS e uma das coordenadoras do LaProNat, Dâmaris Silveira.

 

Para a pesquisadora, à frente do estudo, embora o uso de alguns fitoterápicos possa auxiliar no alívio dos sintomas iniciais da doença, não há evidências de cura e determinados princípios ativos podem oferecer risco ao paciente devido à complexa fisiopatologia da covid-19.

 

CLASSIFICAÇÃO DE RISCO – A partir da lista de espécies, foi feito um levantamento das informações científicas existentes, sendo elaborada tabela própria. A ferramenta foi inspirada no Proact-URL, um guia para tomada de decisão baseado em oito etapas: problemas, objetivos, alternativas, consequências, relações de equilíbrio, incerteza, atitudes de risco e decisões vinculadas.

 

Para avaliar o risco/benefício de cada tratamento, foi criada uma classificação relacionando dois tipos de evidência: clínica e de segurança. Todas as combinações entre elas direcionam a quatro resultados possíveis: positivo, promissor, desconhecido e negativo.

Critérios de consenso de classificação de risco/benefício. Arte: Igor Outeiral/Secom UnB

 

Entre as plantas que apresentam evidência positiva e baixo risco estão o malvavisco (Althaea officinalis), a mirra (Commiphora molmol), o alcaçuz (Glycyrrhiza glabra), a hera (Hedera helix) e o sabugueiro (Sambucus nigra). Há ainda aquelas que são promissoras, mas precisam de maior comprovação científica de sua eficácia e segurança. Nesse grupo estão o alho (Allium sativum), a equinácea (Echinacea angustifolia, Echinacea purpurea), o óleo de eucalipto (Eucalyptus globulus), a magnólia (Magnolia officinalis) e o gengibre (Zingiber officinale).

 

"Mesmo que possam ser utilizadas como auxiliares no tratamento da gripe comum ou nos sintomas respiratórios iniciais leves da covid-19, elas não representam cura ou prevenção para essa doença", enfatiza Dâmaris Silveira. Para efeito de comparação, foram aplicados os mesmos critérios de avaliação a três fármacos geralmente recomendados (ibuprofeno, paracetamol e codeína). Destes, somente o ibuprofeno foi considerado promissor e os demais tiveram classificação de efeito negativo.

 

Grande parte dos fitoterápicos foi classificado como desconhecido, ou seja, não há informação disponível suficiente para subsidiar a análise. "Esse fato é interessante, pois refere-se a espécies largamente utilizadas e que constam em documentos oficiais. Assim, é necessário aumentar o conhecimento sobre seu potencial terapêutico para definição de protocolos voltados ao alívio dos sintomas iniciais da enfermidade", sugere a docente.

 

"Com base nessa análise comparativa, alguns fitoterápicos podem ser úteis como tratamento auxiliar dos sintomas respiratórios, sempre que forem produtos de alta qualidade. Mas é preciso estar atento a qualquer declaração falsa sobre as propriedades medicinais de produtos contendo essas plantas e que não estejam devidamente regulados pelas autoridades sanitárias ou não foram submetidos a controle oficial de sua qualidade", alerta.

Na opinião de Dâmaris Silveira, a adaptação da ferramenta para a avaliação de risco e benefício de plantas medicinais é algo inédito. Foto: Arquivo pessoal

 

PARCERIA INTERNACIONAL – O artigo é também resultado de um estágio sênior realizado pela docente na University College of London (UCL), no Reino Unido, por meio do Programa Institucional de Internacionalização da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes-Print).

 

Na ocasião, Dâmaris foi recebida pelos professores Jose Maria Prieto-Garcia (à época vinculado à UCL, hoje atua na Liverpool John Moores University, também no Reino Unido) e Michael Heinrich. Prieto-Garcia já tem cooperado com a pesquisadora da UnB e, há alguns anos, foi professor visitante especial na FS pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). 

 

Além de consolidar as parceiras já existentes, o trabalho também deu início a colaborações com pesquisadores de outras instituições: Trinity College Dublin, na Irlanda; Medical University of Bialystok, na Polônia; Instituto Venezolano de Investigaciones Científicas (IVIC), na Venezuela; e a Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

 

"Isso mostra a importância de iniciativas como o Capes-Print, que propiciou a imersão em outra cultura e ambiente acadêmico, bem como a interação com cientistas de outro país, abrindo portas para a realização de estudos em conjunto", ressalta Dâmaris Silveira.

 

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