Método desenvolvido no Instituto de Química da Universidade de Brasília para determinar o local de produção de cocaína a partir de amostras apreendidas supera padrão usado em investigações internacionais. A técnica foi aprimorada em pesquisa de mestrado defendida nesta quarta-feira 30 pelo perito criminal federal Élvio Dias Botelho.
O novo procedimento, batizado de CLAE/EM, é mais rápido, barato, seguro e fácil de ser executado do que o método padrão, chamado CG/DCE e desenvolvido pela agência americana Drug Enforcement Administration (DEA). Esses são quatro dos seis parâmetros internacionais usados para avaliar a qualidade de análises químicas – que prevêem também que elas devem ser efetivas e robustas. Nos quatro quesitos, os resultados do modelo de Élvio apresentaram indicadores superiores.
A análise detecta o teor de truxilinas nas folhas de coca, planta que dá origem à cocaína. A concentração de truxilinas é maior em plantas que cresceram em lugares com maior incidência de raios ultravioleta. “Com o índice de truxilinas, podemos saber a altitude em que o plantio aconteceu e se foi mais distante ou mais próximo do Equador”, explica Elvio. Segundo valores apurados em estudos internacionais, um teor menor que 3% indica que a droga provavelmente tem origem boliviana, um valor entre 3 e 4,9% aponta o Peru como local de plantio e acima de 4,9% para a Colômbia. Tanto a cocaína quanto a truxilina são encontradas naturalmente na planta.
Além da análise do teor, outras duas metodologias precisam ser aplicadas para determinar com precisão o local exato onde a droga foi produzida: a espectrometria de massa de razão isotópica e a análise de alcalóides tropânicos. As três etapas são adotadas pelo DEA, o que garante mais precisão na localização da droga. No Brasil, a Polícia Federal realiza apenas parte do processo, porque não dispõe de toda a tecnologia, o que torna a identificação mais trabalhosa.
A novidade que Élvio apresentou foi suprimir uma das etapas do processo adotado atualmente, a que transforma a truxilina em uma substância mais estável. “Tradicionalmente isso é feito porque no método convencional a truxilina se degrada durante a análise, o que afeta o resultado final”, explica Elvio.
Para evitar o efeito indesejável o pesquisador usou uma tecnologia diferente para realizar a etapa mais importante da análise: a cromatografia. A técnica utiliza um aparelho que separa substâncias de uma mistura e determina o teor de cada uma delas em relação ao total. Só que, normalmente, um gás é usado para impulsionar o material analisado e no método proposto por Élvio se utiliza um liquido.
O pesquisador aplicou o novo método em 160 amostras da droga apreendidas pela Polícia Federal em 2010. O método proposto gastou apenas 23 minutos para analisar cada amostra, enquanto que no CG/DCE o tempo empregado foi de uma hora.
A redução do tempo de pesquisa tornou o método também mais econômico: o preço por amostra no CG/DCE é de sete reais, já no CLAE/EM o valor cai para apenas um real. O pesquisador poupou justamente nas substâncias necessárias para a etapa de redução e derivatização. Algumas delas, inclusive, ofereciam grandes riscos a pesquisadores e técnicos. “O hidreto de lítio e alumínio, por exemplo, é explosivo em contato com água”, afirma Ricardo Bastos, orientador da pesquisa. O aldrin, outra substância usada no processo, é um agrotóxico proibido no Brasil por sua toxidade. Tudo isso se reflete também numa queda substancial do grau de dificuldade para aplicar o método.
PRECISÃO - O CLAE/EM, contudo, perdeu em efetividade para o método padrão. “Comparamos os teores de truxilina obtidos em um estudo reconhecido do DEA com os resultados da pesquisa”, explica Elvio. “Quanto mais próximo desses valores, mais precisos eles são”. Para se ter uma ideia, esses valores de referência – obtidos pelo método CG/DCE – ficaram numa faixa que variou entre 0,22% e 12,3%. Com o mesmo método, os resultados de Elvio ficaram entre 0,28% e 11,9%. Usando o CLAE/EM, por outro lado, a faixa obtida foi de 0,54% a 36% - bem distantes dos valores de referência.
Os pesquisadores agora trabalham para atacar o problema. Segundo Ricardo, a provável causa da imprecisão é a interferência de outras substâncias na análise das truxilinas. “Nesse caso, mesmo a própria cocaína atrapalha no resultado final”. Ele acredita que basta acrescentar uma etapa de purificação na análise para o problema ser resolvido. “Mesmo com esse procedimento extra ainda seríamos mais rápidos que o método padrão”, afirma.
Atualmente, o método criado pelo DEA não chega a ser aplicado como uma rotina na Polícia Federal. “Seria inviável bancar os procedimentos ou treinar profissionais para realizá-los”, conta Elvio. “Mas com o aprimoramento da metodologia tem ampla perspectiva de se tornar o método padrão em todo mundo”, destaca Ricardo.